Segundo Bruno Garcia Redondo, Procurador e professor da UERJ, a proteção de dados pessoais tornou-se um dos maiores desafios do Direito contemporâneo, especialmente perante a expansão digital e a utilização intensiva de informações sensíveis por parte de empresas e governos. O tema exige uma abordagem equilibrada entre inovação tecnológica e segurança jurídica.
Com a entrada em vigor da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), o país passou a contar com uma base legal mais robusta, mas os dilemas práticos permanecem. A aplicação da norma, os limites do consentimento, a responsabilização por fugas de dados e a actuação da Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) são apenas alguns dos pontos que requerem atenção constante por parte do Poder Público e da sociedade civil.
O direito à privacidade como garantia constitucional
O direito constitucional à privacidade é um dos pilares do Estado Democrático de Direito. Previsto no artigo 5.º da Constituição Federal, serve de base a outras legislações infraconstitucionais, como a LGPD e o Marco Civil da Internet. Trata-se de uma garantia individual que protege o cidadão contra intervenções indevidas na sua vida pessoal, familiar e profissional.

Conforme explica Bruno Garcia Redondo, a privacidade deve ser compreendida de forma alargada, abrangendo não apenas aspetos íntimos da vida do indivíduo, mas também o controlo sobre os seus próprios dados. Num ambiente digital hiperconectado, essa proteção torna-se mais complexa e exige a actuação ativa do Estado, do Poder Judicial e das entidades reguladoras.
Desafios na aplicação da LGPD no sector público e privado
A implementação da LGPD trouxe desafios significativos tanto para o sector privado como para o sector público. Empresas de todas as dimensões tiveram de rever as suas políticas de tratamento de dados, investir em sistemas de segurança da informação e nomear responsáveis pelo tratamento de dados pessoais. Já os organismos públicos enfrentaram obstáculos ainda maiores, como a adequação de sistemas legados e a escassez de profissionais qualificados.
De acordo com Bruno Garcia Redondo, a principal dificuldade reside na conciliação entre o interesse público e os direitos individuais. Muitos entes públicos recolhem e processam dados com base nas suas competências legais, o que levanta discussões sobre a necessidade, ou não, de consentimento em determinadas situações.
Fugas de dados e responsabilização jurídica
Episódios envolvendo grandes bases de dados expostas, tanto no sector público como no privado, evidenciam fragilidades na segurança cibernética e colocam em risco a integridade e a privacidade dos cidadãos. Nestes casos, surgem questões relativas à responsabilidade civil, administrativa e até penal.
Como esclarece Bruno Garcia Redondo, a responsabilização por incidentes de segurança deve considerar o grau de diligência da entidade envolvida, a extensão do dano causado e as medidas adoptadas para mitigar os efeitos da fuga. A jurisprudência ainda está em formação, e a actuação da ANPD será fundamental para estabelecer diretrizes e promover segurança jurídica.
A proteção de dados pessoais como direito fundamental autónomo
Nos últimos anos, o debate sobre a autonomia da proteção de dados pessoais como direito fundamental ganhou força. A Emenda Constitucional n.º 115, promulgada em 2022, elevou esse direito ao patamar constitucional, o que reforça a sua importância no ordenamento jurídico brasileiro. Esta alteração fortalece a LGPD e amplia o alcance da proteção em todas as esferas da vida social.
Como destaca Bruno Garcia Redondo, o reconhecimento da proteção de dados como direito fundamental impõe ao Estado o dever de garantir a sua efetividade, tanto por meio de políticas públicas como por instrumentos legais. Isso inclui, por exemplo, a regulação da actuação de empresas tecnológicas, o controlo da utilização de dados por plataformas digitais e a responsabilização por práticas abusivas.
Caminhos para o fortalecimento da cultura de privacidade
A construção de uma cultura sólida de proteção de dados no Brasil depende de ações contínuas e integradas, envolvendo desde a educação digital da população até à capacitação de profissionais em privacidade e segurança da informação. Bruno Garcia Redondo salienta que é necessário avançar na criação de mecanismos eficazes de fiscalização, mas também na construção de ambientes organizacionais éticos, onde o respeito pela privacidade não seja apenas uma exigência legal, mas parte da cultura institucional.
O futuro da privacidade no Brasil
O controlo de dados pessoais continuará a ser uma das principais pautas jurídicas nas próximas décadas. Com o avanço das tecnologias de vigilância, inteligência artificial e análise preditiva, novos dilemas éticos e jurídicos surgirão. O equilíbrio entre inovação e direitos fundamentais será constantemente posto à prova, exigindo respostas céleres e fundamentadas. Para Bruno Garcia Redondo, a proteção de dados é um compromisso com a dignidade humana e com os princípios fundamentais do Estado de Direito.
Autor: Abidan Santos